segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Sobre a vida, a morte, e a religião

A vida é uma corrida contra a morte.
É uma corrida eterna, que começa antes mesmo do nascimento - já que podemos morrer ainda no útero de nossas mães. Às vezes nós relaxamos e ela encosta na gente, nos faz sentir a majestosa dor de sua foice pontiaguda. Às vezes nós tropeçamos e ela nos alcança. Pode ter sido uma besteira, um sacríficio, ou uma idiotice. Não importa o quê, ela nunca falha em nos alcançar. Exceto, é claro, nas vezes em que ela não consegue, por estarmos muito na frente, ou por ela estar ocupada demais.
Mas tem gente que confunde isso com bondade divina.
Eu não. Eu penso que esses momentos são puros descuidos-não-tão-divinos assim.
Deus estava muito ocupado dando AIDS para um bebê africano, câncer para pais de família, deixando uma criança ser abusada e prostituída, ou meramente não dando a mínima para nós aqui embaixo, ou sejá lá o que se enquadre no quadro de passatempos dos céus.
Às vezes, ficamos velhos e/ou cansados demais para correr - aviso aos gordinhos como eu - e ela simplesmente chega até nós - e é bom que saibamos o que estamos deixando para trás.
É por esse tipo de coisa que às vezes eu me pergunto sobre o - AVISO: clichê chegando - sentido da vida. A maioria das pessoas nasce, vive, morre, e é esquecida, e é ser esquecido é que realmente matar alguém.
Mas será que não existe alguém por ai, com um pequeno templo para aquele soldado que morreu há tantos anos, na primeira guerra? Será que não existe algum coração eternamente partido pela morte do amado? Nenhum marido fiel enlutado para sempre, de alma ferida pela perda da cobiçada "outra metade"?
E, quando eles forem embora para o grande plano do vazio, alguém vai chorar por eles como eles choravam por outros? Alguém por acaso vai substituí-los no seu luto, e chorar pelos mortos dos outros?
Eu não sei dizer. Eu realmente não sei dizer.
Essas perguntas são o maior motivo para a existência da religião. Essa vã esperança humana de ter, afinal, valido a pena todo o esforço na vida.
"Mas existe o céu dos animais?", pergunta a criança aos pais, olhando para o cachorrinho velho e doente.
"Claro que sim", respondem. Mas eles acreditam nisso? O que nos torna diferentes dos outros animais? Inteligência, DNA, tamanho, raciocínio lógico, fala? Ou somos escolhidos por Deus para sermos assim e pronto?
Você pode ensinar sua religião para uma criança, mas, para ela, Deus vai continuar sendo os pais dela. E um cachorro? Será que ele tem alma, essência? Para um cachorro, Deus é o dono, que provém comida, carinho e abrigo.
E nós por acaso podemos cumprir a tarefa herculeana que é ser responsável por outro ser? Nem sempre.
Nem sempre.

4 comentários:

  1. Não creio que perguntas que levem em consideração a saudade do outro sejam o maior motivo para a existência da religião. Acredito que o maior motivo para isso seja simplesmente a necessidade de acreditar que o fim não é tão ruim quanto parece, amenizar algo terrível no qual as pessoas se recusam a acreditar ou, até mesmo, a esperança - pelo fato de uma vida miserável - de que algo melhor virá. Enfim. Outra coisa da qual discordo é a visão de deus. Não penso que para uma criança o deus sejam seus pais ou que para um cachorro o seu deus seja seu dono. A concepção de deus é algo muito relativo e que não cabe numa única definição. A que tipo de deus, Matheus, você se refere? Ao que parece, um deus fornecedor, aquele que dá tudo do que precisamos.

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  2. Exatamente, Hannah, mas eu tenho que dizer algumas coisas sobre isso.
    A questão não é realmente a "saudade" do outro, mas sim a saudade aliada à esperança de reencontrarmo-nos todos após à vida.
    O que eu fiz no começo do texto (que não era sobre religião a principio) foi tentar exprimir esse tipo de pensamento de uma maneira mais profunda do que simplesmente "a necessidade da crença de que tanto sofrimento acaba valendo a pena".
    "A maioria das pessoas nasce, vive, morre, e é esquecida, e é ser esquecido é que realmente matar alguém", e de fato não era a minha intenção deslizar para esse tipo de conclusão, mas sim, falar sobre a saudade na terra é importante. É interessante avaliar isso porque a maioria dos adultos tem alguém por quem enlutar-se, e é fato: "A maioria das pessoas nasce, vive, morre, e é esquecida, e é ser esquecido é que realmente matar alguém".
    Por fim, sim, você está certa, eu não consigo conceber um Deus que não seja assim. De fato, essa é a visão que se tem sobre um ser desses, não é? A oração não é prova disso?
    E eu tenho que discordar.
    Para uma criança, os pais estarem zangados com ela é o fim do mundo; para ela, os pais sabem tudo, e podem tudo, e veem tudo, e são modelos de pura perfeição.
    Idem para um cachorro.
    :)

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  3. "e é ser esquecido é que realmente matar alguém." minha nova filosofia de vida ;)

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  4. obrigado
    \o
    e ninguem notou que está escrito errado, né?
    "realmente matar", considerem um erro de digitação :)

    mas ainda assim, obrigado por fazer as minhas palavras tão importantes :)

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