quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Dead Men Tell No Tales

Dead Hearts Tell No Lies
only frightening truths
and shattered dreams
Dead Souls Tell No Stories
only shrieks and moans
of its past lives
Dead Trees Tell No Wishes
only broken promises
and tearful good-byes
Dead Houses Tell No Memories
only crimson stains
in a dark living room
Dead Messiahs Tell No Miracles
only treacherous comrades
and madder grins
Dead Writers, However,
can make you smile
and make you cry
no matter if
they're still alive

domingo, 16 de outubro de 2011

Alice

No espelho do lago ela vê a face da dor.
No espelho do lago ela vê
No espelho do lago ela vê
Um futuro sombrio. No espelho do lago, no espelho do lado.
Uma sombra inefável, de um mistério abandonado - ou será
Que ele simplesmente jamais fora pertubado
por puro bom senso
de mil exploradores
mortos e enterrados?
No lago uma casa do espelho, que é e não é
Pois senão que a vida que corre em suas veias mal é e não é
Pensa e não pensa, quer e não quer
Pois que ela morre e não morre
Como gato
No espelho do lago ela vê uma sombra profunda
Uma sombra em plena penumbra, um eclipse
Uma lágrima fora de hora
Uma página fora de forma
Uma nuvem em forma de faca
Fadiga, faminta, feeling, fée fait une fournaise de feu
No espelho do lago ela vê маяк света 
E o próprio rosto, que brilha como a lua ensandecida
Cai num rêve e esquece de tudo aquilo
E quem dirá
que ela não sonhava
desde o princípio?

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

O Vento que vem do Norte

O apartamento é tão vazio.
Mas o mundo continuou girando eternamente, as pessoas continuaram girando internamente, a cada um o ostracismo que lhe cabe.
Bem, eu não estou pronto para girar, eu quero parar, sentir meu sangue saindo das pontas dos dedos, sentir o ébrio desequilíbrio que me traz.
Eu não quero esse ostracismo de que me incumbiram, não quero vestir essa farda.
Eu só quero parar.
Eu não quero morrer - pelo menos não até agora -, só quero parar por fôlego, e prometo que volto à tona. Prometo.
Eu só... Eu não consigo... Não consigo ver! Não consigo ver essa merda de mundo continuar a girar!
Então é isso, não é? "No final das contas somos todos sobreviventes de nós mesmos".
Todos os dias o sol bate no meu rosto, à caminho do trabalho, e eu tento sentí-lo vibrar em sua majestade, mas só o que alcança o meu rosto é o fedor pútrido do vento que vem do norte. E frio.
O frio é a pior parte.
Às vezes eu me pego no meio da madrugada sem sentir meus dedos. Às vezes eu tento me mexer mas não consigo! Não consigo! É como se eu de repente não me pudesse controlar... e vem tantos barulhos horríveis de noite. Sons do inferno, vozes atormentadas, almas retorcidas.
Aí passa.
Eu me mexo de novo, e fico feliz por isso.
A felicidade, porém, é tão fugaz quanto o vento que vem do norte.


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Outra madrugada, e eu contemplo a fotografia de nós três, tolos felizes que éramos.
Eu, à direita, com uma expressão que dizia "estou fazendo cara feia, mas é só brincadeira, campeão!", Neto, nosso filho, que só se chamava "Neto", apesar de não ser nomeado em função de nenhum avô, com um sorrisão-ão-ão, como ele gostava de dizer, no auge dos seus cinco anos. Clarice, oh, Clarice.
Clarice e seus cabelos cor de mel e noz moscada. Não tinha o sorriso mais bonito de todos, mas certamente tinha os olhos mais lindos que eu já vi.
Apaixonei-me por olhos âmbar, que mudavam de cor sob luzes diferentes. Uma espécie reflexo da sua própria existência tão fluida quando possível, de languidez tão... Tão... lânguida. Foge às minhas habilidades descrevê-la, e isso me dói mais que acordar de um sonho em que ela ainda está viva e perceber dela não restaram nem as cinzas, somente um túmulo vazio no meio de tantos outros.
Eu só queria ter algo mais que aquela foto para lembrar-me deles. Aquela foto é antiga, e é tudo o que eu tenho. Tudo que sobreviveu ao incêndio.


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Hoje foi outro dia normal.
Se é que "normal" ainda pode definir a minha vida.
Certamente que não.
Hoje eu entrei no carro sem olhar para os lados, mas o vento que vem do norte me surpreende mais uma vez com seu odor cremoso, quase como se estivesse fazendo o seu melhor para me convidar até lá.
Eu me pergunto se devo ir até lá. Também me pergunto se alguém mais sente esse cheiro.
Eu olho para as pessoas na rua, ainda girando e jogando seus ostracismos até mim, e percebo que não, decididamente não.
A ideia de visitar o lugar acalenta minha mente de novo, e eu sou atingido em cheio por memórias daquele dia.
Eu receberia o aviso ainda no hospital, e correria até o carro e arrancaria do estacionamento com tudo.
Ficaria preso no engarrafamento.
Chegaria tarde demais.
Os bombeiros diriam que tinha sido um vazamento de gás que ninguém tinha notado até Clarice querer fazer um café no fogão.
Eles também diriam que o fogo se espalhou muito rápido para que alguém pudesse fazer algo. Diriam que o meu filho ficou preso no andar de cima sem ter lugar para onde ir, até morrer sufocado na fumaça e no calor.
Que Clarice queimou até a morte ainda na cozinha, provavelmente correndo e espalhando mais fogo pela casa.
Clarice queimando, seus cabelos cor de mel e noz moscada se desfazendo num pequeno tufo crespo.
Seus lindos olhos âmbar morrendo, derretendo.
Deles não resta mais nada, só dois buracos negros cadavéricos.
Eu chegaria tarde demais, e veria minha casa queimar como uma fogueira de São João, e assistiria às casas vizinhas impassíveis, e à multidão se formando. Ouviria que, foi mal, doutor, mas você não pode entrar lá. Foi mal, doutor.
E eu tentaria gritar com tudo o que tinha nos pulmões, gritar até tossir sangue, mas eu me encontraria sem voz alguma.
Eu me ajoelharia, impotente.
Porque eu havia chegado tarde demais.


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Estou chorando como uma criança agora. As memórias estão me atacando como nunca, e o vento que vem do norte tomou conta da minha casa como se sabendo da minha fraqueza.
Eu desisto de vez.
Eu olho para a pistola na minha mão, mas eu sei que não vou atirar.
Porque o vento que vem do norte continua aqui, e ele quer algo de mim.
Eu me levanto e pego as chaves do carro, e dirijo até o local que jurei jamais voltar.


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O homem segue o caminho até o local do incêndio.
Já faz dois meses, mas as faixas amarelas ainda proíbem a entrada na pilha de cinzas onde ele costumava viver.
O vento que vem do norte é mais forte ali. Ele sabe que é tolice chamar aquilo de norte sem nem mesmo saber se é norte, mas chama mesmo assim.
Ele estaciona e desce do carro, o cheiro ficando mais distinto a cada passo.
Não era um odor de morte que vinha dali.
Eram cinzas, mel e noz moscada.
Ele age como se soubesse exatamente o que está fazendo, mesmo sem fazer ideia daquilo.
Passa por debaixo da faixa e começa chapinhar em meio às poucas cinzas que restam.
De repente, ele realmente sabe o que está fazendo.
Ele anda até o fundo do lote e se joga no chão, escavando fundo nas cinzas, e lá está a caixa.
Ele a abre e a encontra cheia de fotos deles, antigas e recentes.
Ele não sabe porque elas estão ali, ou o que explicaria o fato de ele saber onde elas estavam.
Ele só está tão feliz. Tão, tão, tão feliz, que começa a chorar ali mesmo, olhando para as fotos.
E grita, grita um grito desesperado de felicidade e insanidade, entre lágrimas nas cinzas.
Ele grita, enquanto amanhece.
E o sol brilha. E ele sente paz.
Sente calor.

domingo, 2 de outubro de 2011

A Casa na Beira do Rio - Parte 1

Meu avô costumava me contar histórias da sua infância.
Eu ficava fascinado com aqueles causos infantis, de pães roubados, brigas escolares, verdadeiras Helenas de Tróia que provocavam celeumas de proporções épicas.
Todas as histórias que ele me contou - hoje eu sei que elas eram todas verdade - começavam do mesmo jeito: Carlos Roberto saía de casa com um olhar matreiro de quem procura confusão, encarando a rua norte de Tupiniquim-maior, uma cidadezinha pequena no interior de Minas. Rua esta perto da Igreja, que também funcionava como escola nos fundos.
Segundo ele, era uma boa vida, mas eu tenho minhas dúvidas.
Ele tinha muitos amigos em Tupiniquim-maior, mas, em julho de 1945, dizia, teve de se mudar para a capital, indo morar com os avós, por causa dos estudos. Nunca me explicara direito o porquê da mudança - dizia que os pais dele queriam que ele tivesse uma vida melhor, coisa que uma igreja-escola de interior jamais poderia oferecer.
De causo em causo, meu avô jamais se esquecia dos detalhes, mesmo tendo Alzheimer, o que é normal, segundo os médicos. Aparentemente, os idosos têm mais facilidade de recordar esse tipo de memória porque está numa área não-afetada pela doença, por serem memórias de longo prazo. Mas eu sei a verdadeira razão de ele jamais ter esquecido do que acontecera em Tupiniquim-maior.
Oh, Deus, eu estou segurando ela agora mesmo.

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Tudo o que eu vou narrar aqui aconteceu anos atrás, em maio do ano de 1945, e só chegou até mim ontem à noite, pela boca do meu próprio avô, no seu leito de morte.
Eu fui chamado no celular pelo Dr. Oliveira ontem à noite. "Melhor você vir logo", disse-me, "Seu Carlos não vai aguentar muito tempo aqui, esperamos o óbito para essa madrugada ainda". Isso não me chocou, por incrível que pareça. Nós já esperávamos que ele fosse partir logo, e ele também já dava sinais de já querer ir também. Mamãe não queria ver aquilo, e foi para um retiro semana passada, para tentar lidar com a perda do pai.
Não tem sido fácil para ela. Desde que papai morreu, ela não foi mais a mesma - caramba! Ela nem dirigia mais! -, sempre andando de um lado para o outro, murmurando e resmungando.
Não vou mentir e dizer que não me sinto mal. Se aquele bêbado não tivesse entrado na contra-mão com tanta rapidez, se papai não estivesse voltando do supermercado, se... Bem, tem muitos se's nessa história. Abelardo Nogueira morreu voltando das compras, provavelmente ainda pensando no jantar, e minha mãe simplesmente não conseguia aceitar aquilo, mesmo já fazendo oito meses desde que ele morreu.
Nem eu, eu acho.
Agora que eu penso, ele morreu numa quarta-feira, assim como meu avô.
Quais são as chances?


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Como eu não tenho nenhum irmão ou tio, e minha avó Júlia já partiu para o outro lado em dezembro de 2000 - mas já estávamos esperando essa, também; ela vinha lutando contra o câncer havia três anos -, a morte do meu avô foi bastante solitária. Só eu, ele, e um monte de aparelhos que tentavam mantê-lo vivo só por tempo suficiente para que eu pudesse dizer adeus. Porém eu acho que o que tem nessa caixa que agora seguro é o que o manteve vivo esse tempo todo, uma história só esperando para ser contada. Ele viveu uns bons oitenta anos, uma vida culminando naquele momento, naquele quarto hospitalar, naquela cama.
A priori, eu não achei que ele fosse falar - acho que nem os médicos esperavam isso -, e ele realmente passou alguns minutos dormindo, antes de abrir os olhos e me ver.
Eu esperava chorar naquela hora, mas vê-lo tão pequeno, tão velho, tão frágil, naquela cama realmente me tocou no fundo.
Ele tirou o aparelho respirador, claramente capaz de fazer aquilo sozinho, pelo menos por enquanto.
"Onde está", disse, pausando para respirar, "sua mãe? Cadê Ana?".
"Bem, vô, o senhor sabe como ela está. Ela não quer ver ninguém, foi para um retiro", respondo, coçando a cabeça um pouco, como quem sabe que está dando uma desculpa esfarrapada.
Ele se ajeita na cama e encara o teto, "Bem, eu acho que devia ser assim mesmo, Davi". Ele tem um ar de quem finalmente compreende as coisas, e as aceita bem como elas são.
"Você realmente foi o único que sempre gostou de ouvir minhas histórias, não é mesmo? Acho que já estava escrito para ser assim". Eu o pergunto por que ele fala daquele jeito, mas ele simplesmente balança uma mão no ar e diz: "Talvez exista um Deus por aí - não aquele para quem a gente costuma rezar, mas um completamente diferente. E talvez esse Deus seja sádico.
"Cheguei a um ponto da minha vida, filho, em que essa opção parece ser a mais correta. Afinal de contas, que tipo de Deus faria isso com uma pessoa?".
"Morrer nunca foi fácil, vovô, eu não acho que seja legal você ficar falando esse tipo de coisa tão perto de vê-lo pessoalmente", digo, um pouco irritado.
"Morrer?", ele diz, num tom de risada sarcástica, "Filho, morrer é tudo o que eu quero nesse momento. Caramba, eu vivi a minha vida esperando o momento em que eu simplesmente fosse morrer!".
"Quer dizer que o senhor não gostava da gente, se arrepende de ter vivido o suficiente para ver sua filha crescer, para me ver crescer?", agora eu estava irritado mesmo. Por que ele diria aquilo?
"Não, não, Davi, vocês nunca foram o problema.  Sempre existiram outras coisas... Coisas ruins".
Eu não respondo, mas continuo encarando-o.
"Lembra das minhas histórias? Lembra de como eu me mudei por causa dos meus pais, em julho de 45?"
Eu digo que sim, mas não acrescento que eu acho que meu avô havia finalmente perdido toda a sanidade tão perto de morrer.
"Não foi bem assim.
"Meus pais nunca quiseram que eu me mudasse de Tupiniquim-maior. Foi eu quem insistiu para mudar de cidade. Por fim, eu os venci pelo cansaço, afirmando que eu queria ter oportunidades melhores na capital. Eles me perguntavam se eu não sentiria falta dos meus amigos, ou deles. Eu dizia que sentiria para sempre falta deles, dos meus pais, mas que poderia arranjar amigos novos na capital.
"Dito e feito, depois de dois meses de insistência, meus pais aproveitaram o fim do semestre para me matricular numa escola de Belo Horizonte".
"Mas, por que você faria isso, vovô, você não gostava dos seus amigos?", perguntei.
"Gostava sim, Davi, mas aconteceu algo terrível entre nós, algo que eu nunca contei para ninguém, nem para Júlia, que eu só conheci anos depois em BH.
"Eu levei dois meses para convencer meus pais a me mudarem de cidade, então os acontecimentos que eu vou narrar agora aconteceram em maio daquele ano. Preste atenção".
E eu prestei.
E ouvi cada palavra que saía da sua boca, mesmo quando eu queria gritar para ele parar, mesmo quando desejava jamais ter atendido o Dr. Oliveira.
Eu ouvi cada palavra em silêncio, enquanto uma sombra pousava naquele quarto de hospital.